ETC, etc.


Em Março de 2007, em Los Angeles, numa animada conferência internacional sobre “O Futuro da Televisão”, Bruce Rosenblum, Presidente da Warner Bros Television Group, surpreendeu o auditório apresentando este novo conceito – o ETC.
“Quando me pediram para vir aqui falar sobre a televisão e o futuro, eu pensei: - Bem, é fácil. Tudo o que se passa resume-se em três pontos - as televisões generalistas, clássicas, confrontam-se com o decréscimo das audiências face ao desgaste da sua oferta de conteúdos; por outro lado, algumas estações privadas, mais ousadas, encontram rentabilidade na descoberta de novos conceitos comerciais, multi-plataforma, interpretando devidamente a revolução tecnológica e a mutação dos hábitos dos consumidores; por outro lado, ainda, os custos de produção continuam a aumentar (menos os dos conteúdos de má qualidade e garantido insucesso), mas a tecnologia faz surgir novas formas de receita que poderão mitigar os custos crescentes. Face a este cenário tripartido, eu vinha preparado para fazer aqui o discurso mais curto da história. Foi quando me apercebi que havia um erro conceptual, generalizado, na organização desta conferência: utilizavam insistentemente a palavra “televisão” quando na verdade queriam dizer “conteúdos transmitidos electronicamente” (electronically transmitted content) – ETC.”
As palavras de Rosenblum, há dois anos, soam actuais, providenciais, neste Março de 2009 em Portugal. Vivemos um momento de viragem, de provável ruptura, uma encruzilhada no audiovisual português. A televisão convencional, clássica (dita generalista, em Portugal) confronta-se com novos desafios. O modelo de programação explorado durante décadas, esticado ao limite pelas televisões, não acompanha o sinal dos tempos. Apeia-se do comboio da modernidade e da tecnologia. Afasta-se. Perde faixas significativas de publico e acusa um inversível desgaste.
“Content is what rises value” (os conteúdos são o que valoriza) dizia o presidente da Warner Bros Television, pondo a tónica na necessidade permanente de encontrar novas soluções, imaginativas, para os conteúdos, leia-se, para a programação, para as grelhas, em televisão multi-plataforma. Casar novas ofertas de programas, ajustadas à segmentação do mercado, multiplicando o modelo de negócio, pode ser a chave do sucesso.
Bruce Rosenblum, na mesma apresentação, disse ainda: “ O potencial do Etc vai muito além do que o nossos olhos podem alcançar. Aquela coisa a que nós, em tempos, chamámos “televisão”, que durante décadas se encontrou paralizada e sujeita ao domínio de três grandes networks, é agora um universo de mudança permanente e imparável. Podemos aceder-lhe interactivamente a partir de computadores, de telefones, de iPods, e porque não, até mesmo através dos aparelhos de televisão”. Rosenblum apontava os operadores clássicos de TV de falta de destreza e de imaginação, de menor habilidade na interpretação das mutações de hábitos dos públicos e, como tal, de menor sucesso comunicacional e comercial.
Para rematar o discurso quase premonitório face à realidade portuguesa, Rosenblum concluia a sua alocução, dizendo: “Quando eu oiço a frase “as três grandes televisões”, penso imediatamente na NBC, na ABC e na CBS; quando o meu filho de 16 anos pensa nas “três grandes televisões”, está a referir-se à ESPN, à Comedy Central e à FOX - os tempos mudaram”.
Março de 2007, Los Angeles. Future of Television Convention. O autor desta coluna que se sentava modestamente entre a assistência, pensou: - um dia, em Portugal, tudo isto será verdade. Será que estaremos preparados? Etc., etc.
João Salvado, realizador
Publicado na revista PREMIERE de Março 2009

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